O que deveria ser uma questão familiar, tratada com a devida sensibilidade e nos foros adequados, transformou-se em uma ruidosa batalha pública que mobiliza comunidades e levanta sérias questões sobre o bem-estar de uma criança de apenas seis anos. De um lado, está a mãe, que detém a guarda unilateral do filho e reside em Santa Tereza do Tocantins. Do outro, a proeminente família paterna, com raízes no agronegócio da região de Buritirana, que iniciou uma intensa campanha nas redes sociais e na imprensa local, alegando que o menino sofre maus-tratos.
A polêmica ganhou força quando a família paterna registrou um boletim de ocorrência e divulgou áudios e vídeos nos quais a criança relataria supostas agressões. As publicações, amplamente compartilhadas, rapidamente geraram comoção e julgamentos precipitados contra a mãe.
Contudo, uma análise mais aprofundada dos fatos revela uma história com contornos muito mais complexos. Fontes próximas à mãe e documentos indicam que a narrativa pode ser bem diferente daquela exposta publicamente.
A Reviravolta: A Retenção da Criança e o Início da Campanha
Até maio de 2025, a guarda unilateral da mãe, estabelecida judicialmente, jamais havia sido questionada. O próprio pai, em acordo homologado, concordara com os termos, que incluíam um regime de visitas. As visitas, no entanto, eram realizadas majoritariamente pela avó paterna, que buscava o neto para os fins de semana.
A situação mudou drasticamente na sexta-feira, 13, quando o pai e a avó buscaram o menino e não o devolveram no domingo, como previa o acordo. Foi a partir desse momento, com a criança já sob sua posse e longe da mãe, que as acusações de maus-tratos começaram a surgir, e os vídeos e áudios passaram a ser produzidos e divulgados.
A defesa da mãe alega que a retenção indevida da criança é o verdadeiro ponto de partida para uma campanha orquestrada de desqualificação, com o objetivo de forçar uma mudança de guarda à margem da lei.
O Contexto: Neurodivergência e a Resistência da Família Paterna
Uma peça-chave para entender o conflito é o fato de que, desde o início do ano, a mãe vinha buscando apoio profissional para o filho. Com o ingresso na rotina escolar, o menino apresentou agravamento nas dificuldades comportamentais, levantando a suspeita de neurodivergência.
Relatórios escolares e encaminhamentos médicos confirmam a busca da mãe por diagnóstico e tratamento, incluindo acompanhamento psicológico e neurológico.
Em contrapartida, áudios e conversas indicam que a avó paterna se mostrava contrária a essa busca por ajuda profissional. Ela teria tentado convencer a mãe a deixar a criança morar com ela na fazenda, argumentando que o menino “não gosta de ir para a escola” e que o acompanhamento médico era desnecessário, tratando a situação como um simples “apego” que ela poderia suprir.
A Justiça como Árbitro Final
Enquanto a família paterna se apoia no boletim de ocorrência que ela mesma registrou, a mãe apresenta relatórios escolares que atestam seu zelo, além do apoio de vizinhos e amigos de Santa Tereza, que refutam as acusações. O principal respaldo da mãe, no entanto, é a decisão judicial que lhe garante a guarda.
O caso já foi levado ao Judiciário, que terá a difícil missão de separar os fatos da guerra de narrativas. Especialistas em Direito de Família alertam que casos como este exigem extrema cautela. A divulgação massiva de apenas um lado da história pode causar danos irreparáveis à reputação da mãe e, mais grave ainda, ao estado psicológico da criança, que se vê no epicentro de um conflito de lealdades.
A expectativa é que a Justiça atue com celeridade para garantir que o melhor interesse da criança prevaleça, investigando a fundo tanto as alegações de maus-tratos quanto a denúncia de alienação parental e o descumprimento de ordem judicial. A comunidade aguarda que a verdade seja restabelecida — não nos tribunais das redes sociais, mas no foro competente, protegendo quem mais importa: o menino.